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Psicologia e Educação

Reflexões Sobre a Prova do Atraso Educacional Brasileiro (Novembro/2009)

No dia que do cancelamento da prova do ENEM, poucas horas depois da notícia do vazamento da prova, consegui baixar em segundos os tais arquivos. Seriam as questões oficiais, que traçariam o destino de milhões de estudantes, não fosse o incidente causado por alguns imbecis da gráfica e do governo. 
O que chamou a atenção desde as primeiras questões-modelo, divulgadas pelo MEC ainda em Julho, é que as escolas brasileiras não preparam os alunos para este tipo de prova. E os modelos iniciais variavam entre as muito fáceis a questões em que realmente nenhum aluno brasileiro consegue responder.
A prova que seria a oficial, não tivesse sido violada, variou solenemente entre questões ridículas, de tão fáceis, e questões absurdas, tamanha a complexidade. Mas como "facilitaram", colocando alternativas facilmente descartadas, a prova ficou "Para Todos".
Se eu fosse um burocrata do MEC que supervisionasse a elaboração das questões, faria o seguinte: ou pediria para imprimirem a resposta certa em negrito (ou já com um X na resposta correta) ou pediria a cabeça do educador que formulou tal questão.
Nos problemas considerados difíceis, as opções de resposta eram tão absurdas que, aqueles que não entrassem em desespero, excluiriam as alternativas tolas e teriam a resposta por dedução óbvia.
Ou seja: Diante da fraqueza de nossos alunos, originada da anemia dos conteúdos e métodos de ensino pré-históricos nas salas de aula brasileiras, frente ao fracasso de nosso sistema de ensino, resta ao governo imbecilizar o nível da prova. Ainda assim, veremos, no ano que vem, a média das notas ser inferior a 5.
Isso mesmo: aposto com você, caro leitor, que discordar de minha "profecia": a média brasileira não será superior a 50%. Mesmo com uma prova risível, com raras questões de maior complexidade, com alternativas que nos empurram à resposta certa, estaremos novamente frente a uma nota ridícula.
Não temos vagas para todos no Ensino Superior. Já é um atestado de incompetência governamental ter de excluir da faculdade muitos alunos que terminam o Ensino Médio. 
Mas aplicar uma prova tão chinfrim foi demais. Pior que isso, só a resposta involuntária dos nossos alunos: eles vão muito mal, até porque a maioria nem entende o que está escrito. Nossos jovens desacreditaram no ensino, como desacreditamos na honestidade da prova. Ou menos: Nossos alunos desacreditam a Educação, como nossos (des) governantes desacreditam na capacidade educacional. 
Ninguém luta por aquilo que não acredita. Nossos jovens não acreditam no Ensino Escolar. Por mais e melhor que o professor trabalhe os conteúdos com nossos alunos, a Wikipedia, para eles vale mais. O "São Google" tem maior credibilidade.
Mas a desconfiança que tenho é que os alunos dessa "geração CTRL: C+ CTRL V" assumiram o controle do INEP ou do MEC. Alguns deles se formaram e entraram nos setores que elaboraram as questões. 
Só pode ser isso! Qual o motivo de termos uma prova tão desconexa, travestida de investigadoras de habilidades e competências? 
Os professores sentem ano a ano as turmas enfraquecendo, chegando cada vez menos preparados e sem o conhecimento mínimo nos anos finais dos níveis fundamental e médio. Como professor universitário, sinto a cada semestre a diferença. 
Ao ler as questões do ENEM que foi violado, entendi o que nossos dirigentes esperam do povo: pessoas sem cabeça, sem voz, sem vez. Sempre desconfiei disso, desde a época de estudante que queria mudar o mundo. Mas jamais supus que registrassem graficamente o tamanho do estrago na cabeça do brasileiro.
Claro que questões difíceis não provam nada nem significam ensino de alto nível. A questão é o foco.
O que esperam de nossos jovens?
O próximo ENEM será no mesmo estilo da prova que vazou. E olhe, que já melhorou muito!
É hora de dos educadores se prepararem para capacitar nossos alunos. 
As questões demonstram que o ensino e a avaliação por mais contextualizados que possam parecer no discurso oficial, ficam longe de educar e de conscientizar.
A prova evidencia a distância entre o real e o ideal na Educação. Há necessidade urgente de mudanças tanto nas disciplinas e suas formas de ministrá-las, quanto naqueles que regem a Educação e seus parâmetros.
Somos desinformados, somos analfabetos funcionais, somos preconceituosos e não exercemos a cidadania, apontam as pesquisas.
Nossas gerações futuras ficarão ainda sem acesso completo ao ensino superior, sem falar da qualidade.
E a qualidade do que é ensinado nos manterá nas últimas colocações dos exames internacionais. 
Quem pode mudar este quadro? Você, caro e eficiente professor. Mãos à obra!

JECC IV - 2022