ESCOLAS PÚBLICAS IMPORTAM

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Só existirá uma democracia no Brasil
no dia em que se montar a máquina
que prepara as democracias.
Essa máquina é a escola pública.
(Anísio Teixeira)


No presente annus horribilis global, a pandemia do Corona vírus e as manifestações sociais em reação aos brutais assassinatos de George Floyd nos EUA e de João Alberto no Brasil escancaram a desigualdade dos afrodescendentes. Esses dois processos sociais colocam de relevo, de forma incisiva, os conceitos de lugar de fala e de racismo estrutural.

No Brasil, país vergonhosamente desigual, o confinamento da pandemia deu visibilidade aos grupos socialmente vulneráveis, que Pierre Bourdieu chamou “a miséria do mundo”, formado por maioria de afrodescendentes.

O isolamento social em comunidades de favela é praticamente inviável porque seus habitantes vivem em casas ou casebres pequenos e precisam trabalhar cotidianamente para sobreviver.

O fosso de classe fica ainda mais explícito em relação ao ensino remoto porque os filhos das famílias socialmente despossuídas não contam com computadores, internet estável e ambiente cultural adequado que as classes médias e as elites têm.

O movimento ativista Black Lives Matter explodiu após a morte de George Floyd, provocando protestos capilares nos EUA e no mundo. A afirmação “eu não consigo respirar” dita pelo afro-americano antes de ser morto pelo joelho de um policial branco, reverberou para uma leitura sociológica, indicando o tratamento assimétrico entre brancos e negros.

Mutatis mutandis isso se verificou na truculência paleolítica sofrida por João Alberto no Carrefour de Porto Alegre. As desigualdades sociais de afrodescendentes norte-americanos e brasileiros são também desigualdades escolares porque o percurso em instituições formais de educação joga um papel decisivo nas trajetórias sociais.

Apesar da atitude negacionista em relação ao racismo verbalizada pelo vice-presidente e repetida pelo primeiro mandatário da nossa república, tanto os EUA como o Brasil têm uma história de longuíssima duração de escravidão e, a partir de Lei Áurea, mais de um século de exclusão social dos afrodescententes.

Os dois maiores países do nosso continente apresentam racismo na sua formação social, mas as sociedade norte-americana e brasileira têm diferenças culturais marcantes – incluindo os preconceitos. Os processos de tempos longos demoram mais para serem desconstruídos, mas é preciso que o racismo estrutural no Brasil seja derrubado como as estátuas de escravistas que tombaram neste ano, provocadas pela onda Black Lives Matter.

Enfim, há várias frentes do enfrentamento do racismo estrutural. No sistema educacional, acredito que as escolas públicas podem ajudar a reverter as desigualdades sociais e étnico-raciais gritantes na sociedade brasileira mediante a sua reinvenção pedagógica e o estabelecimento de uma carreira atraente para seus professores. Ou seja, para materializar nossa democracia social, escolas públicas importam!